Mudanças da Anatel na telefonia não vão ‘acabar’ com lojas de operadoras; número será reduzido
Conteúdo investigado: Vídeo em que um homem afirma que uma “decisão da Anatel pode acabar com as lojas da Vivo, Tim e Claro no Brasil”. Em sua fala, ele utiliza um texto do site Terra Brasil Notícias concluindo que a mudança deixaria os brasileiros isolados do mundo e que ninguém estaria fazendo algo para evitar isso. O homem também faz menção, em tom conspiratório, ao decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) assinado no início do mês pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Conclusão do Comprova: É enganosa a postagem em que um homem afirma que o Brasil seria “isolado” do restante do mundo em função de uma decisão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que, segundo o conteúdo lido por ele, reduziria drasticamente o número de lojas físicas das operadores de telefonia em todo o país. A mudança mencionada no vídeo, na realidade, é uma alteração do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RCG), que permite o fechamento de lojas de telefonia.
O texto utilizado como fonte na peça de desinformação fala sobre “uma drástica redução no número de lojas físicas das operadoras de telefonia, como Tim, Vivo e Claro”. O título da publicação, no entanto, diz que a decisão “pode acabar com lojas”.
A nova regra muda o regulamento aprovado em 2013. Anteriormente, as operadoras de telefonia deveriam manter ao menos uma loja de atendimento presencial para cada regia~o com 100 mil habitantes ou mais, com uma unidade adicional a cada 400 mil habitantes. Essa regra deixará de valer. Fica previsto que o atendimento presencial passará a ser facultativo, mediante regras de acessibilidade. Para o fechamento de unidades, será necessária a autorização do Grupo de Implantação das mudanças. As alterações só entram em vigor em setembro de 2024.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: Até o dia 9 de novembro, a publicação do TikTok tinha 9,5 mil visualizações. Posteriormente, não foi mais possível mensurar o alcance, pois a postagem e o perfil responsável foram excluídos.
Como verificamos: Primeiramente, o Comprova buscou no Google pelos termos “fechamento lojas de telefonia celular” e “decisão da Anatel vai fechar lojas Vivo, Tim e Claro”. Como resultados, encontramos notícias (G1, O Globo, Estadão) divulgando uma mudança no Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações, aprovada no dia 27 de outubro deste ano, pelo Conselho Diretor da Anatel.
Depois, tentamos contato com o autor da postagem. Entretanto, pouco tempo após o início da investigação, o post e página responsável foram desativados. Também contatamos a Anatel e as operadoras mencionadas no material investigado.
Mudança no regulamento e controvérsias
No dia 26 de outubro deste ano, o Conselho Diretor da Anatel aprovou mudanças no RGC. As alterações foram publicadas em 10 de novembro no Diário Oficial da União (DOU). No texto, foi estabelecida uma nova regra com relação ao número de lojas físicas que as operadoras são obrigadas a manter.
No Art. 20 consta que a “existência de estabelecimentos da Prestadora ou de terceiros que explorem exclusivamente a marca da Prestadora é facultativa, mas, uma vez existentes, devem oferecer Atendimento Presencial”. O documento não delimita uma regra específica em relação ao quantitativo de unidades por região.
Por meio de nota, a Anatel explicou que as lojas presenciais deviam ser usadas para a realização de atendimentos aos consumidores, mas alguns estabelecimentos exploravam a marca das operadoras para a venda de aparelhos. Neste caso, elas não eram obrigadas a prestar atendimento ao consumidor, o que segundo a agência, foi alterado com a revisão do regulamento.
“A partir de setembro de 2024, quando entram em vigor as novas regras, não haverá mais a obrigação específica quanto à quantidade de lojas citada acima. Mas o atendimento presencial deverá ser realizado em todas as lojas próprias ou de terceiros que utilizem exclusivamente a marca da prestadora para vender produtos ou serviços. Em outras palavras, todas as lojas das prestadoras agora serão lojas aptas a prestar atendimento presencial”, destacou a agência.
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No texto, a Anatel destaca ainda que “não existem fundamentos para a tese levantada no vídeo de que as lojas vão acabar”. A agência ressaltou ainda a fundamentação do membro do Conselho Diretor que propôs a submissão da regra à consulta pública ainda em 2020.
“Ao prever a obrigatoriedade de atendimento presencial nos estabelecimentos comerciais que explorem a marca da Prestadora, atrela-se o atendimento à sua estratégia comercial. Como a prestadora provavelmente optará por vender, ela continuará prestando o atendimento presencial, atendendo os consumidores em toda e qualquer demanda”, afirmou.
A Anatel explicou que a maior parte do atendimento dos consumidores é realizada por meio de canais digitais (aplicativos e website) ou telefônicos.
Mesmo aprovada, a medida não teve apoio unânime. Um dos conselheiros, Vicente Aquino, presidente do Comitê de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomunicações (CDUST), destacou a relevância de se manter a obrigação à existência de estabelecimentos para atendimento presencial aos assinantes.
Aquino argumentou que, com dados extraídos das mais recentes Pesquisas de Satisfação da Qualidade Percebida divulgadas pela agência, parcela significativa da população recorre a essa forma de atendimento, especialmente os mais idosos e com menor renda. No entanto, o colegiado aprovou por maioria a proposta do ex-conselheiro Emmanoel Campelo, que tornou a existência de lojas facultativas.
Garantia da Lei e da Ordem em SP e RJ
No vídeo investigado, o homem menciona ainda um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O autor da publicação sugere, em tom conspiratório, enganosa relação entre o decreto e um processo de isolamento do país. No início de novembro, o chefe do Executivo autorizou a GLO em áreas nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
Desde então, o governo federal, por meio das Forças Armadas, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, está autorizado a atuar no Porto do Rio de Janeiro, Porto de Itaguaí (RJ) e Porto de Santos (SP), bem como no Aeroporto do Galeão, no Rio, e no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. A GLO tem validade apenas em territórios federais até maio do ano que vem, com a possibilidade de ampliação.
As ações foram mobilizadas para tentar combater o crime organizado. O objetivo, segundo a gestão, é minimizar a entrada de recursos financeiros ao crime organizado, dificultando a logística e freando o abastecimento de drogas e armas. Na época em que foi assinado o decreto, o Rio de Janeiro vivia escalada de violência. Ao menos 35 ônibus e uma composição de um trem urbano já tinham sido incendiados por grupos criminosos em retaliação à morte de um miliciano na capital fluminense.
O governador de São Paulo, Tarcisio Freitas (Republicanos), e Cláudio Castro (PL), do Rio de Janeiro, foram favoráveis ao decreto.
O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível contatar o autor do post, pois a conta responsável pela veiculação foi desativada logo após o início da investigação. Antes disso, o envio de mensagens diretas era bloqueado no perfil. Existem outros perfis na mesma rede social com a mesma foto e nome do autor do post, mas todos estão com a função de mensagens bloqueada. Esta não é a primeira verificação do Comprova relacionada a tal autor.
O que podemos aprender com esta verificação: É comum que desinformadores utilizem informações reais fora de contexto para tentar imprimir a sensação de verdade em teorias conspiratórias. Neste caso, é aproveitado também que as mudanças foram aprovadas recentemente e a implementação ainda não aconteceu de forma concreta para gerar medo na população diante da incerteza. Termos alarmistas, como “isolamento do Brasil”, também são utilizados para ampliar a sensação de pânico.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já esclareceu que não foram feitas mudanças na lei que dispõe sobre o pagamento de pensões por invalidez ou morte em casos de acidente de trânsito. Também explicou a proposta do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar para destinar terras de “grandes devedores” a assentamentos de produtores rurais, por meio do processo de adjudicação de imóveis.
Fonte: Estadão